Bruce Lee (1940-1973) | Foto: divulgação
Em 20 de julho de 1973, após fazer anotações sobre seu mais recente filme em produção, Bruce Lee, 32, sentiu fortes dores de cabeça, tomou um analgésico e foi dormir. Horas depois, foi encontrado morto, vítima de um edema cerebral nunca totalmente explicado, mesmo 50 anos depois do acontecimento. Na época, Lee era o oriental mais conhecido em todo o planeta. Celebrado como mestre das artes marciais chinesas, estava para iniciar uma potencial carreira de sucesso em Hollywood. Sua partida interrompeu não só a vida, mas toda a movimentação cultural e geopolítica que se iniciava graças aos esforços de Lee. Apesar da enorme popularidade quando vivo, foi depois da morte que ele ficou lendário. É fácil perceber como o fascínio em torno de Lee se amplificou rapidamente para bem além de sua obra cinematográfica.
Ele protagonizou só quatro filmes num intervalo de dois anos. Foram três em Hong Kong —”O Dragão Chinês”, em 1971; “A Fúria do Dragão” e “O Voo do Dragão”, em 1972— e um em Hollywood, lançado um mês depois da morte do astro —“Operação Dragão”, de 1973. Deixou ainda um trabalho inacabado, “O Jogo da Morte”, reaproveitado por produtores em 1978 com 11 minutos de cenas de Lee lutando na sequência final. A dura verdade é que nenhum desses filmes faz jus ao tamanho de Bruce Lee, mas todos se beneficiaram de sua presença magnética. O carisma nas cenas cômicas, nas filosofias de batalha, nos flertes com jovens chinesas e principalmente nas impressionantes coreografias de luta o fizeram um símbolo extraordinário. A movimentação rápida —alguns cineastas pediam a Lee que se mexesse mais devagar para que as câmeras captassem alguns golpes—, os olhares fulminantes aos adversários, os gritos de “waaaaah!” e a técnica perfeita suplantavam os enredos simplórios. Quase ninguém é capaz de lembrar das tramas desses quatro trabalhos, mas qualquer pessoa que os viu não esquece as proezas monumentais de Bruce Lee.
Lee Jun-fan, nome de batismo, nasceu em 1940 em São Francisco, na Califórnia, onde a família passava temporada por conta de uma turnê do pai, que era cantor de ópera numa companhia de Hong Kong. Lee voltou à terra natal aos quatro meses de vida. Aos nove anos, participou do filme “Kid Cheung”, de 1950. Apesar de uma carreira mirim prolífica, meteu-se em várias brigas de rua, foi perseguido e decidiu estudar artes marciais para se defender. Em 1959, aos 19, foi morar nos EUA. Na metade dos anos 1960, dividiu esforços entre trabalhar no audiovisual —foi parceiro do herói na série “Besouro Verde”— e ensinar kung fu. Chegou a criar uma técnica própria de combate, o Jeet Kune Do —ou “o punho que intercepta”. Sentiu o racismo e a xenofobia da América ao não conseguir bons papéis em Hollywood. Tudo piorou quando os estúdios Warner Bros. deram o personagem principal da série “Kung Fu”, concebida por Lee, ao caucasiano David Carradine.
O ator retornou a Hong Kong e aceitou pouco dinheiro para estar em “O Dragão Chinês”, mas o longa foi o maior sucesso do Sudeste Asiático até então e o catapultou ao estrelato. Ele foi fundamental nas relações entre Hong Kong e EUA ao participar de “Operação Dragão”, primeira coprodução entre ambas as nações, assumida justamente pela Warner. A morte repentina do ator no meio da campanha de lançamento chamou mais atenção ao filme, que se tornou um ponto de virada no gênero da ação e das fitas de kung fu, grande mania dali adiante. O vácuo deixado por Lee fez surgir um subgênero próprio, o chamado “bruceploitation”, que consistia em filmes de baixíssimo orçamento com sósias nomeados Bruce Li, Bruce Le, Bruce Lai ou Bruce Chen.
Por outro lado, artistas marciais asiáticos de grande talento foram para o cinema aproveitando as possibilidades abertas por Lee, casos de Donnie Yen, Jackie Chan, Jet Li, Michelle Yeoh e Tony Jaa. Astros no Ocidente, como Chuck Norris — seu ex-aluno —, Jean-Claude Van Damme e Scott Adkins, também devem parte do sucesso ao caminho traçado por Lee. Meio século depois do desaparecimento abrupto, Bruce Lee é onipresente em cada uma dessas trajetórias.
FSP – 20/7/23