Um artigo escrito pelo consultor jurídico aposentado Mário Montanha Teixeira Filho critica os argumentos que sustentam a reforma administrativa (PEC 32/2020), encaminhada ao Congresso Nacional pelo governo de Jair Bolsonaro. O texto também foi publicado no blog do Zé Beto no dia 9 de julho (confira abaixo).
A reforma administrativa é terraplanista
Mário Montanha Teixeira Filho
O país segue a sina dos dias tumultuados, do futuro incerto e das mortes em série. Uma CPI machuca o governismo, expondo evidências de fraudes, roubos e crimes diversos emanados do centro do poder. De braços dados com um pedaço das Forças Armadas, o capitão presidente defeca pela boca e sonha com um novo golpe de Estado. Tudo assim, num aparente caos que condena o gigante ferido ao isolamento e ao ridículo.
Enquanto isso, uma figura se mantém ativamente cruel e insensível no cenário político, sem ser incomodada. O chefe da Economia, neoliberal tresloucado e autor de projetos destinados ao fracasso, cumpre o triste papel de destruir o que resta de direitos atribuídos à imensa maioria da população que não sabe o que é “mamata”. Privatizações à Bangu, terceirizações, precarização do trabalho e, mais recentemente, reforma administrativa, tudo faz parte do receituário de Paulo Guedes, um ser poupado de críticas e questionamentos pela mídia.
Pois essa figura, tão próxima dos donos do dinheiro, tem se dedicado a “reordenar” a administração pública. Como costuma fazer, promete o paraíso à custa do esmagamento dos mais fracos. Exibe a reforma como solução que não virá, mas que serve aos interesses da banca internacional e seus discípulos internos. O projeto do governo, identificado como PEC 32/2020, é o arremate da tragédia brasileira anunciada, muito tempo atrás, por Fernando Collor de Mello e seus auxiliares.
Com garantias dadas à nata do funcionalismo – corporações militares, cúpulas do Judiciário e do Ministério Público, Legislativo e outros setores qualificados como “típicos de Estado” –, que se safou da reforma, as mudanças retrocedem o Estado à sua configuração patrimonialista, anterior a 1930. Transformam funcionários públicos em serviçais de governo, sem autonomia técnica e sujeitos a formas variadas de perseguição política.
O modelo parece feito de encomenda para a gestão negacionista de agora, para o terraplanismo triunfante que fez mais de 500 mil vítimas fatais e continua a eliminar vidas. Existe um sonho antigo, o sonho do capital que mira o lucro e nada mais, que quer estabelecer o comando da atividade pública, legitimar a desigualdade social e perpetuar a concentração da riqueza. Eis a grande realização prometida pelo bolsonarismo.
A reforma administrativa, que tramita silenciosamente no Congresso Nacional, é mais uma mentira anunciada como progresso por entusiastas da modernidade que exclui a maioria, explora o trabalho e condena milhões de pessoas à escravidão fantasiada de empreendedorismo. Por esse e por vários outros motivos, ela não pode ser aprovada.
Mário Montanha Teixeira Filho é consultor jurídico aposentado.
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