Com a proximidade do pleito eleitoral, muitos empresários do comércio em geral têm dúvidas sobre a possibilidade de abrir seu negócio no dia do pleito, em virtude de a data ser configurada como feriado ou não. A legislação trabalhista proíbe, como regra geral, o trabalho em dia de feriados, pois “todo empregado tem direito ao repouso semanal remunerado de vinte e quatro horas consecutivas, preferentemente aos domingos e, nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, de acordo com a tradição local”, conforme prescreve o artigo 1º da Lei 605/49. As exceções a essa regra, com autorização permanente para o trabalho em feriados, estão estabelecidas a partir do artigo 151 do Decreto 10.854/21 e nas atividades constantes do anexo IV da Portaria/MTP 671/21.

São feriados, para fins trabalhistas, de acordo com a Lei 9.093/95, 1) os declarados em lei federal, 2) a data magna do Estado e 3) quatro feriados religiosos decretados por lei municipal, neles incluída a Sexta-feira Santa (feriado com data móvel, pois depende do calendário litúrgico cristão). Há vários feriados nacionais, declarados em lei federal, como o 12 de outubro (Lei 6.802/80), o 1º de janeiro e o 7 de setembro (Lei 662/49), e o dia das eleições gerais (artigo 380 do Código Eleitoral – Lei 4.737/65).

Especificamente sobre o dia das eleições gerais, o artigo 380 do Código Eleitoral é claro ao prescrever que “será feriado nacional o dia em que se realizarem eleições de data fixada pela Constituição Federal; nos demais casos, serão as eleições marcadas para um domingo ou dia já considerado feriado por lei anterior”. As eleições gerais têm, segundo a Constituição de 1988 (artigo 77), uma data fixada no primeiro domingo do mês de outubro do último ano do mandato. Trata-se, portanto, de feriado de data móvel, mas sempre em um domingo, aos moldes daquele da Sexta-feira Santa (data móvel mas sempre as sextas). A ideia por trás da decretação do feriado em dia de eleição é facilitar o direito-dever de votar de todo cidadão, proporcionando sua ida à sessão eleitoral.

Importante lembrar que é permitido o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral, desde que autorizado em convenção coletiva de trabalho e observada a legislação municipal, conforme preceitua o artigo 6º-A da Lei 10.101/00, tema já pacificado no Supremo Tribunal Federal (Súmula Vinculante 38 e Súmulas 419 e 645 do STF). Em outras palavras, somente pode abrir o comércio em geral e exigir o trabalho de empregados no dia de eleição (pois se trata de feriado), desde que observadas as condições nas convenções coletivas de trabalho vigentes (note-se que não é possível a autorização via acordo coletivo!) e nas leis municipais da localidade.

O Tribunal Superior Eleitoral vem entendendo que o artigo 380 do Código Eleitoral permanece em vigor (ver o acórdão da Consulta 0600366-20.2019.6.00.0000, Relator Min. Jorge Mussi, de 29/08/2019), pois, inexistindo norma em sentido contrário, o dia das eleições é feriado nacional. Neste último julgado do TSE, ficou consignado que “a partir da evolução jurisprudencial da temática nesta Corte Superior, conclui-se que os dias de escrutínio são feriado — aplicável referida regra, quanto ao segundo turno, somente às localidades em que este ocorrer —, mas é possível que o comércio funcione nessas datas, desde que se observem as normas de convenções coletivas de trabalho, as leis trabalhistas e as respectivas posturas municipais, bem como não se cause embaraço ao exercício do sufrágio dos funcionários, sob pena de se ter configurado o crime do artigo 297 do Código Eleitoral”.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST), por outro lado, em alguns julgados turmários, vem entendendo que a Lei 10.607/02 suprimiu o dia em que forem realizadas eleições em todo o país como feriado nacional e, em razão disso, não haveria incidência de pagamento em dobro nem obrigatoriedade de não exigir o trabalho no dia do pleito. Em que pese a posição do TST, com as devidas vênias, entendo que feriado civil, para fins trabalhistas, é aquele declarado em lei federal (e o Código Eleitoral é uma lei federal). A intenção do legislador, desde o advento do Código Eleitoral e da obrigatoriedade de votar, é facilitar o acesso do eleitor às urnas. Portanto, a exigência de comparecer ao trabalho, salvo as exceções já previstas em lei, seria incompatível com esse direito-dever do cidadão.

Ressalte-se que somente no final dos anos 1990 e início dos anos 2000 é que o comércio em geral teve a abertura aos domingos autorizada e a possibilidade de trabalho em feriados, culminando na Lei 10.101/00. Ao se fazer uma interpretação sistemática e teleológica, portanto, é possível concluir que: 1) o dia das eleições é feriado civil, declarado em lei federal (artigo 380 do Código Eleitoral); 2) o trabalho do comércio em geral, em dia de feriado, só pode ocorrer se atendidas as condições estabelecidas em convenções coletivas e de eventual lei municipal, de acordo com o artigo 6º — A da Lei 10.101/00; 3) o TSE permite a abertura do comércio no dia das eleições, desde que atendidas as condições em normas coletivas e lei municipais; 4) a exigência de trabalho no comércio em geral, no dia do pleito, fora das hipóteses legais e do entendimento do TSE, pode configurar crime de embaraço ao exercício do sufrágio (artigo 297 do Código Eleitoral); e 5) as empresas autorizadas por lei a funcionarem no dia do pleito devem se utilizar do bom senso para, em comum acordo com empregados, programarem a liberação para que o direito-dever do voto possa ser exercido em conciliação com a atividade empresarial.

Portanto, o próximo domingo é feriado nacional. O exercício do direito do voto é um direito fundamental de todo cidadão, que, por sua vez, tem o dever e obrigatoriedade de votar. O dia da eleição é de festa cívica e de celebração da democracia. Os empresários do comércio em geral e os trabalhadores devem ficar atentos a tudo isso, como forma de exercer a plena cidadania, respeitando os costumes locais e o que foi negociado na convenção coletiva.

 

Eduardo Pragmácio Filho é doutor em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), pesquisador do Getrab-USP e autor do livro “A boa-fé nas negociações coletivas trabalhistas”