Os debates sobre a situação dramática em que o Brasil se enfiou prosseguem em torno do óbvio. Passam pelas redes sociais, chegam à CPI, reverberam na imprensa, visitam tribunais, dividem famílias e acompanham passivamente os milhares de mortes que espalham sangue e tristeza pelo vasto território. Com todo esse aparato discursivo, o genocida que detém o cargo mais alto de comando permanece em seu posto, pouco incomodado e a serviço de uma doutrina ensandecida que repudia as evidências científicas, a racionalidade, o senso de humanidade, a vida.

A pergunta que fica é: até quando? Não se sabe. O poder de fato, exercido por prepostos do capital financeiro, pela elite parasitária, pelos donos da riqueza concentrada em pouquíssimas mãos, o poder de fato sinaliza tolerância com o monstro. Não é por acaso que Paulo Guedes e seu neoliberalismo selvagem têm sido poupados de críticas pela direita que se pretende “civilizada” e se apresenta como “centro”. Com pequenas oscilações de velocidade, afinal, as reformas sonhadas pelos adeptos da totalização do mercado estão aí, a esmagar o que resta das conquistas sociais – bastante limitadas em seus efeitos, diga-se – postas na Constituição de 1988, que agoniza.

Essa equação interesseira carrega os seus perigos. O capitão-presidente não está sozinho. Seus atos se dirigem a um público específico, que não forma a maioria mas se revela numericamente significativo. Uma reunião do esgoto da política, de falsos profetas, fundamentalistas religiosos, membros das Forças Armadas, milicianos, saudosistas da ditadura e fanáticos anestesiados pela estupidez sem limites.

Não é pouca coisa. Num ambiente de anomalia institucional, de ameaças reiteradas a qualquer resquício de democracia, os movimentos aparentemente destrambelhados do chefe de Estado têm uma força destruidora que não pode ser desprezada. Seus crimes continuados e impunes estimulam a violência oficial e contribuem para a formação de um ambiente de intolerância e ódio. As vítimas preferenciais, como de costume, estão nas periferias, com seus corpos negros perseguidos por projéteis seletivos.

Para quem pensa que a solução está em 2022, talvez seja interessante observar com um pouco mais de atenção e sensibilidade a tragédia que acaba de destruir 500 mil vidas neste país abandonado à própria sorte (ou ao próprio azar). Uma tragédia causada pelo vírus terrível, mas também – e principalmente – por uma política de trevas, de morte e crise permanente. Um pesadelo que precisa acabar o quanto antes.

A solução não está em 2022. A solução tem que ser agora. Chega de genocídio!

 


Mário Montanha Teixeira Filho é consultor jurídico aposentado.