Paulo Guedes tem se relevado tão farsante, incompetente e mal-intencionado quanto o seu patrão – aquele elemento que, ao comparecer à Assembleia Geral da ONU, uma vez mais envergonhou o Brasil com um discurso mentiroso, de candidato a vereador em carroceria de caminhão, como bem definiu Elio Gaspari. Pois o outrora fulgurante “Posto Ipiranga” não passa de um arremedo de economista, que imagina consertar o país privilegiando os poderosos e achacando a população contribuinte. Administrar mantendo a brutal carga tributária, retirando vantagens historicamente conquistadas pelos cidadãos e criando maldosamente novos tributos qualquer um faz.

Como se saíram as reformas trabalhista e previdenciária perpetuadas no ano passado para “salvar” o Brasil? Os objetivos da reforma trabalhista, firmada no final de 2019, foram a criação de mais de 3,5 milhões de novos postos de trabalho e a geração de um crescimento adicional do PIB (Produto Interno Bruto) de 7%. O resultado até aqui verificado, no mundo real, é que a taxa de desemprego, em 2020, subiu para 12,6% no trimestre encerrado em abril, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em maio, foi elevada para 12,9%, fechou o segundo trimestre em 13,3%, e agora está em 13,8%, com a perda recorde de 8,9 milhões de postos de trabalho, perfazendo um total de 32,9 milhões de pessoas. Já o PIB deste ano deve ficar em torno de pífios 1,17%, de acordo com as estimativas de especialistas.

A reforma previdenciária, além de conseguir dificultar ao máximo as aposentadorias da população e diminuir o valor dessas aposentadorias e de inúmeros benefícios, trouxe como novidade a elevação da contribuição previdenciária mensal. Para o trabalhador privado, passou a ser de 11,69% e para os servidores públicos vai até 16,53%. Tudo para o bem do Brasil…

Neste ano da graça de 2020, os gênios do zeloso ministro Guedes trabalham para concretizar as reformas administrativa e tributária. O principal objetivo da reforma administrativa, segundo os seus bem-intencionados mentores, é acabar com os privilégios do serviço público. O interessante é que a medida exclui, desde logo, os militares, os juízes, os desembargadores, os ministros dos tribunais superiores, o Ministério Público, os embaixadores e os parlamentares, isto é, as classes mais privilegiadas da Nação, capazes de burlarem com grande desfaçatez o limite salarial constitucional de R$ 39,2 mil, através dos mais diversas e safadas artimanhas, e amealhar rendimentos mensais superiores a R$ 100/200 mil, fora os auxílios moradia, saúde, transporte, alimentação, educação, vestuário e o raio que os parta.

A reforma tributária tem como propósito principal a volta da maldita CPMF, mascarada como imposto sobre movimentação bancária, que vem a ser a mesma coisa. Está estigmatizada como o mais cruel, nocivo e indecoroso imposto. No entanto, é uma das ideias fixas dos Guedes-boys. Para o advogado e tributarista Osíris de Azevedo Lopes Filho, que foi secretário da Receita Federal de FHC quando o monstro foi criado, a CPMF é o mais nefasto de todos os impostos, exatamente porque penetra na base econômica de quase todos os tributos. E tem incidência em cascata, atingindo toda a população, sem distinção, e onerando cumulativamente toda a produção do país, além de comprometer a competitividade dos produtos nacionais.

Luiz Inácio rotulava a CPMF de “uma canalhice”, quando ainda usava barba preta e não era inquilino no Palácio do Planalto. Depois, já no trono, usufruiu, enquanto pôde, da calhordice sob os falsos argumentos de fiscalizar a movimentação financeira e gerar recursos para a saúde pública. Tudo embuste. A CPMF serviu sempre, apenas, para aumentar as burras do Tesouro, sem nenhum resultado para a população, a não ser o de empobrecê-la um pouco mais. Foi uma luta acabar com ela, em 2007. Mantega, aquele que hoje desfila com uma tornozeleira eletrônica, queria prorrogá-la, no mínimo, até 2010. Levou chumbo. Dilma tentou revivê-la, mas não tinha cacife para tanto.

Agora, chegou a vez do capitão-presidente. Jurou não ter a menor intenção de recuperar a maldição. “Votei pela revogação da CPMF na Câmara e nunca cogitei a sua volta. Ninguém mais aguenta novos impostos, temos consciência disso” – anunciou no início do governo. Depois, no twiter, negou a CPMF por três vezes (qual o apóstolo Pedro fez com Jesus). Faz parte da farsa. A nova edição da patifaria tentou partir do então secretário da Receita, Marcos Cintra, como ITF. No jogo de cena do Planalto, foi defenestrado do governo. “Já falei para o Guedes: para ter nova CPMF, tem de ter uma compensação para as pessoas”. “Senão ele vai levar porrada até de mim” – fingiu o capitão.

Agora, a “compensação” seria a “desoneração da folha de pagamento das empresas”. Quer dizer, alivia a empresas e achaca a população. Na verdade, trata-se de nova empulhação, nova cilada para os cidadãos desta nação. Como opção, acena com a extinção do desconto de 20% ao contribuinte que optar pela declaração simplificada do Imposto de Renda das pessoas físicas, o que atingirá mais de 17 milhões de pessoas. Gente fina, esse Guedes!…

O governo arrecada muito, mas gasta mal e demais. O objetivo é só o aumento da arrecadação. E de forma – repita-se – solerte, atroz e intolerável em um país marcado pela pobreza da população. Basta de atirar sobre o lombo do contribuinte os efeitos dos descaminhos e das mazelas administrativas. Pior: querer resolver um problema criando outro maior.

Precisam aumentar a receita? Pois façam o que governo algum teve coragem para fazer: cobrem de quem deve e não paga. Dos poderosos, dos especuladores, dos grandes conglomerados empresariais, dos bancos, das financeiras, das igrejas… Daquela gente graúda que nunca teve o prazer de contribuir para as despesas públicas, mas apenas vale-se delas. A hora é essa.

 

Célio Heitor Guimarães é jornalista e consultor jurídico aposentado.

 

(Publicado originalmente no blog do Zé Beto em 8/10/20)