A polêmica sobre os juros de mora da URV devidos ao funcionalismo está longe de terminar. Depois de ser julgada pelo Órgão Especial, que admitiu, em novembro de 2019, a existência de diferenças salariais correspondentes ao período que vai de março de 1994 a março de 2002, a matéria voltou ao Departamento Econômico e Financeiro (DEF). O objetivo foi corrigir erros na aplicação dos juros nesse intervalo – o Tribunal de Justiça havia utilizado o índice de 0,5% ao mês, enquanto os magistrados receberam, em situação parecida, diferenças de 1% ao mês.
Metodologia alterada – No SEI nº 0028262-83.2020.8.16.6000, que trata do assunto, o DEF explicou os mecanismos utilizados para apurar os créditos restantes. A informação foi prestada no final de junho, em resposta a um pedido da Assejur, e considerou que a dívida da administração terminaria em agosto. Na verdade, os números mostram que a metodologia de cálculo foi alterada no último período. Entre março de 1994 e agosto de 2001, haviam sido pagos juros de apenas 0,5% ao mês – a quitação aconteceu entre novembro de 2017 e dezembro de 2019. Com a decisão do Órgão Especial, esse percentual foi alterado para 1%. No segundo pagamento – a metade dos juros –, iniciado em janeiro de 2020, porém, os servidores receberam quase 80% a menos do que havia sido calculado na primeira etapa.
Falta de isonomia – Essas distorções foram apontadas pela Assejur numa petição datada de 31 de agosto. O documento identifica a falta de isonomia entre magistrados e servidores, e busca a reelaboração dos cálculos. Segundo a conclusão do estudo, os servidores ainda têm valores a receber. O expediente, agora, voltará ao Gabinete da Presidência, para manifestação sobre o impasse.
O que diz a petição da Assejur
Percebe-se, desde logo, que o DEF, sem observar o teor do acórdão do Órgão Especial que enfrentou o assunto, estabeleceu uma diferença objetiva: para os magistrados, os juros de 1% ao mês se estenderam até agosto de 2001; para o funcionalismo, a última projeção de pagamento com o percentual maior se deu em julho de 2001 (em agosto de 2001, o cálculo passou a considerar o índice de 0,5%). Esse aspecto não é o principal, mas sugere a continuidade de tratamento anti-isonômico no âmbito da administração.
Ainda que os elementos para que se antecipe um cálculo alternativo ao elaborado pelo DEF sejam insuficientes, e não esclareçam como foram obtidos os resultados mais antigos nas contas que envolvem a PAE e a URV, as peças deste SEI informam a ocorrência de alteração metodológica que contradiz as decisões referentes ao assunto.
A impressão de que o crédito do funcionalismo se expressou em valores menores do que os devidos não é fortuita, e sinaliza a preferência da administração por um critério de cálculo que não havia sido empregado antes. Confirmado isso, há que se fazer a retificação, para que o acórdão 4675482 mantenha a sua integridade. A ‘fórmula original’, mencionada pela ora requerente em sua contestação, atualizou os valores da PAE, e é a que deve prevalecer nas decisões originárias do protocolo nº 367.652/2013 (afastamento da prescrição da URV entre março de 1994 e março de 2002).
Todos os procedimentos que beneficiaram a magistratura no caso da PAE deveriam ter prevalecido no cálculo das diferenças de URV acumuladas entre março de 1994 e março de 2002. Mas esse princípio de igualdade se observou em parte, apenas. Os números […] refletem uma distância enorme entre o que foi pago na primeira fase – em que o erro consistiu na incidência, entre março de 1994 e agosto de 2001, de juros de 0,5% ao mês, e não de 1% ao mês, como deveria ser – e o saldo apurado depois da decisão do Órgão Especial. A respeito do assunto, o DEF se baseou, unilateralmente, em fórmula que não existia na época da aquisição do direito, não foi debatida nos expedientes analisados pela administração e contraria o acórdão que resolveu a controvérsia.
O segundo período de pagamento, que se estende por 90 meses, é menor do que o primeiro, de 97 meses, nos quais os juros de mora foram calculados em 0,5%. A retificação foi imposta pelo acórdão 4675482, que reconheceu que, entre março de 1994 e agosto de 2001, o índice aplicado deveria ter sido de 1% ao mês. Entre os dois períodos, é possível estabelecer, em termos aproximados e mantido o critério de cálculo aplicado na origem, um coeficiente de proporção de 0,927835 (90 meses / 97 meses). Isso quer dizer que, se o valor hipotético de 100 correspondesse ao que foi pago […] na primeira etapa, […] [o resultado] deveria […] [ser]92,78 na segunda etapa. Acontece que, com a mudança da fórmula de apuração, o crédito sofreu um decréscimo de 78,95%, ficando em apenas 19,54.
Note-se: i) a URV é objeto de procedimentos administrativos desde 1994, quando da extinção da antiga moeda (cruzeiro real), tendo gerado diferenças salariais reconhecidas em favor dos servidores no final de 2008; ii) a impugnação do cálculo dos juros de mora, entre março de 1994 e março de 2002, foi desencadeada pela Assejur no SEI nº 0057771-30.2018.8.16.6000, protocolado nesse Tribunal no dia 20 de agosto de 2018; e iii) o julgamento da matéria aconteceu na sessão do Órgão Especial realizada em 25 de novembro de 2019. Retira-se, disso tudo, que a decisão colegiada validou o sistema de cálculo antigo. Seria absolutamente desarrazoado, de fato, submeter uma situação pretérita a regras que não existiam quando da sua ocorrência […]
[A Assejur pede] que sejam imediatamente refeitos os cálculos de juros moratórios da URV devidos aos representados pela entidade de classe entre março de 1994 e agosto de 2001, período em que foi aplicado o índice de 1% ao mês, de modo a se restabelecer a metodologia utilizada no expediente nº 367.652/2013 e em procedimentos administrativos que beneficiaram a magistratura com o pagamento integral PAE, descontadas as parcelas que já foram pagas, nos termos definidos pelo Órgão Especial no acórdão 4675482, prolatado no SEI nº 0057771-30.2018.8.16.6000, que afirmou o imperativo de tratamento isonômico entre juízes e servidores do Poder Judiciário.