A reforma da Previdência foi retomada pelo governo de Michel Temer (PMDB). Desafiando a crise de popularidade que atinge o chefe do Executivo (o mais rejeitado do mundo), o Congresso Nacional se prepara para votar uma proposta de emenda constitucional sobre o assunto. Serão atingidos todos os trabalhadores brasileiros. No serviço público, especialmente, as mudanças anunciam a revogação de “privilégios”, prometendo igualar – para baixo – o pagamento de benefícios. A campanha contra o funcionalismo faz parte de um esquema de propaganda gigantesco, que confunde dois sistemas que são diferentes em essência – o regime geral da Previdência Social e o regime especial –, para extrair a conclusão de que todos os servidores públicos recebem muito, contribuem pouco e são os responsáveis pela falência do sistema previdenciário. Esse raciocínio desconsidera que, no setor público, as contribuições são integrais (sobre as remunerações individualmente consideradas). Ou seja: os funcionários pagam pelo que recebem durante a velhice ou a invalidez. Embalados por essa falsa polêmica, o governo e seus patrocinadores querem, na verdade, destruir a seguridade social, uma das conquistas da Constituição de 1988, e repassar a administração das verbas que mantêm o sistema ao capital especulativo.

Para auxiliar na compreensão das mudanças, a página da Assejur reproduz, na íntegra, uma reportagem de Afonso Benites, do portal El País, publicada em 25/11 com o título “Entenda a nova proposta de reforma da Previdência da Temer”.     

 

 

Depois de enfrentar sua maior crise política, que envolvia uma delação premiada e duas denúncias criminais, o governo Michel Temer (PMDB) concluiu uma nova proposta para a reforma da Previdência. Apenas três pontos foram alterados entre o projeto que foi aprovado em maio deste ano em uma comissão especial da Câmara e o que foi finalizado agora. Ainda assim, várias alterações ainda podem aparecer, já que o projeto será analisado pelo plenário da Câmara, onde precisa de 308 votos dos 513 deputados para ser aprovado. Um dado que não está claro é sobre o número de pessoas que serão afetadas.

Nem o governo nem os consultores legislativos da Câmara que ajudaram na elaboração do projeto conseguiram delimitar o tamanho da reforma. Deputados governistas dizem que ela atingirá “apenas” 25% dos trabalhadores brasileiros, entre os que recebem os melhores salários. Mas não esclarecem sobre o percentual que incide nessa conta. O país tem 133 milhões de brasileiros em idade economicamente ativa, sendo que 60 milhões deles contribuem para a Previdência Social. Pelos cálculos do Governo, o atual projeto prevê uma economia de 480 bilhões de reais para a próxima década, valor inferior aos 800 bilhões de reais previstos inicialmente. Esse cálculo, porém, não é transparente e não leva em conta um movimento importante, incentivado pela reforma trabalhista, pelo qual o país deve passar pelos próximos anos, que é o da “pejotização” – fenômeno no qual pessoas físicas são contratadas como pessoas jurídicas (PJ), e acaba com uma série de benefícios, impactando tanto na receita quanto na despesa da Previdência Social.

Nesse cenário, por enquanto, as principais mudanças na proposta de emenda constitucional 287 de 2016 são as seguintes:

Idade mínima de 65 para homens e de 62 para mulheres

Só poderão aposentar-se os trabalhadores da iniciativa pública ou privada que tiverem 65 anos (homens) ou 62 anos (mulheres). Essa mudança, porém, passará a valer apenas em 2038. Antes disso, haverá uma regra de transição na qual a idade mínima para aposentadoria na iniciativa privada para homens é de 55 anos e de 60 para o servidor público. No caso das mulheres, essa idade será de 53 e 55, respectivamente. Atualmente, a aposentadoria é feita em uma combinação entre tempo de contribuição e idade. Há uma exceção no projeto quando se trata de professores, policiais e trabalhadores que atuam em atividades com risco elevado à saúde. Até o fim da transição, os professores poderão se aposentar aos 60 anos de idade e os policiais, aos 55, independentemente do sexo. Entre os que têm atividades de risco, não há uma idade mínima.

O tempo de contribuição mínimo será de 15 anos

Inicialmente, o governo queria obrigar o trabalhador a contribuir por pelo menos 25 anos, antes de se aposentar. Agora, essa regra valerá (se aprovada pelo Congresso) apenas para os servidores públicos. Na iniciativa privada, o limite mínimo será de 15 anos. No entanto, só receberá 100% da média salarial de sua categoria quem contribuir por 40 anos.

 

Benefícios de prestação continuada e aposentadoria rural

Na versão aprovada em maio por uma comissão especial da Câmara, havia uma série de alterações que afetavam o BPC, que é um benefício concedido a pessoas portadoras de necessidades especiais, e a aposentadoria rural. Para tentar conseguir os 308 votos na Câmara, o governo Temer abdicou de qualquer mudança nessas áreas.

Teto da aposentadoria

Atualmente, os servidores da iniciativa privada seguem o teto da aposentadoria do Instituto Nacional do Seguro Social. Os servidores públicos, não. Podem receber até o valor integral de seu salário. Se aprovada a PEC, todos receberão apenas o teto do INSS, que hoje é de 5.531. Esse valor será reajustado anualmente pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

Acúmulo de pensão com aposentadoria

Atualmente a pensão é integral, mas pela proposta do governo deverá ser reduzida para 50%, mais 10% por dependente. Além disso, ela será desvinculada do reajuste do salário mínimo, o que permite ganhos reais. Também não será permitido o acúmulo de pensão mais aposentadoria que ultrapasse o valor equivalente a dois salários mínimos. Por exemplo, se uma viúva aposentada recebe uma pensão no valor de 1.000 reais e uma aposentadoria de 900 reais, ela terá de abrir mão de uma das duas, já que o teto, nesse caso, seria hoje de 1.874 reais.

Parlamentares não terão transição

Atualmente, políticos seguem critérios especiais de aposentadoria – podem se aposentar aos 60 anos de idade e 35 de contribuição. A nova regra prevê que eles não passem pela transição. Ou seja, no dia em que a reforma passar a valer, só poderá se aposentar o parlamentar que tiver 65 anos, no caso de homem, e 62, no de mulher. Com o tempo mínimo de contribuição de 15 anos. Seu teto será como o dos demais aposentados, 5.531 reais.

Militares não foram atingidos

Um dos pontos mais polêmicos da proposta, não foi alterado até o momento. Em 2016, o governo prometeu enviar um projeto de lei separadamente para mudar a Previdência da categoria. Mas não o fez. De acordo com um levantamento do jornal O Globo, os militares representam um terço dos servidores públicos, são responsáveis por 44,8% do “rombo” de 72,5 bilhões de reais da Previdência da União.