Apesar de ter natureza alimentar, a verba dos honorários de sucumbência não se enquadra nas exceções previstas pela lei para autorizar a penhora do salário do devedor. A conclusão é da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que fixou tese sob o rito dos recursos repetitivos, em julgamento encerrado no dia 5 de junho. Os honorários de sucumbência são aqueles que são devidos aos advogados da parte vencedora de um processo, e devem ser pagos pela parte perdedora.
O resultado confirma a posição do colegiado firmada em 2020, e inviabiliza a possibilidade automática de penhorar o salário de alguém para pagamento de honorários, mas não a impede totalmente. Isso porque o próprio STJ e o restante do Judiciário têm admitido a penhora de salários para pagamento de dívidas não alimentares, desde que o percentual penhorado não comprometa a subsistência do devedor. A tese aprovada foi a proposta pelo relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Votaram com o relator e formaram a maioria os ministros João Otávio de Noronha, Nancy Andrighi, Herman Benjamin, Herman Benjamin, Og Fernandes, Benedito Gonçalves e Isabel Gallotti.
Não pode penhorar – A penhora de salários para pagamento de dívidas não é permitida, conforme o artigo 833, IV, do Código de Processo Civil. No entanto, há exceções. O § 2º diz que a penhora pode ocorrer em duas situações: para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, ou se o devedor receber mensalmente mais de 50 salários mínimos. Conforme a jurisprudência do próprio STJ e do Supremo Tribunal Federal, os honorários advocatícios se enquadram como verba alimentar. Segundo o relator, ministro Villas Bôas Cueva, isso não os equipara à prestação de alimentos. Uma verba tem natureza alimentar quando se destina à subsistência de quem a recebe e de sua família. Mas só é prestação alimentícia quando é devida por quem tem a obrigação de prestar alimentos.
Despir um santo para vestir outro – Ao acompanhar o relator, o ministro João Otávio de Noronha destacou que a exceção prevista no § 2º do artigo 833 do CPC visa a proteger aquele que está em situação vulnerável, cuja dependência do salário é maior do que aquele que recebe verba de natureza alimentar. “Permitir, como regra, a penhora do salário de um trabalhador para pagar os honorários de outro equivaleria, como diz o ditado, a despir um santo para vestir outro. Creio não ser esse propósito do legislador”, afirmou. Em aditamento ao voto, o ministro Villas Bôas Cueva destacou que admitir a penhora para a classe dos advogados obrigaria o Judiciário a estender a exceção aos demais profissionais liberais. “Deve ser também sopesado que essa prerrogativa, a depender da escassez financeira do devedor, dificultará o recebimento do crédito devido ao próprio cliente que foi representado em juízo”, acrescentou. Ambos afirmaram que, no mais das vezes, os honorários sequer são devidos aos próprios profissionais, mas sim aos escritórios, havendo posteriormente um rateio. O ministro Herman Benjamin seguiu a mesma linha em tom de crítica. “O Brasil é o único país em que os maiores escritórios de advocacia do planeta têm seus honorários qualificados como prestação alimentícia”, disse.
Divergência – Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Humberto Martins, acompanhado dos ministros Raul Araújo, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell e Antonio Carlos Ferreira. Para eles, a penhora de salário para pagamento de honorários pode ser justificada com base no artigo 833, parágrafo 2º do CPC. Isso porque o termo “prestação alimentícia” não se restringe aos alimentos decorrentes de vínculo familiar e pode, também, abarcar os honorários advocatícios.