Tom Jobim (1927-1994): insistência no tema da ecologia denunciava o atraso do Brasil (foto: divulgação)
Nos anos 70 e 80, vivi esta experiência em várias Redações do Rio e de São Paulo em que trabalhei. Quando um repórter sugeria uma entrevista com Tom Jobim, alguém dizia: “Tom Jobim? É um chato. Você pergunta a ele sobre qualquer assunto e ele só quer falar da tal da ecologia”.
Era verdade: Tom só queria falar de ecologia. Mas, longe de torná-lo um chato, sua insistência só revelava o atraso do Brasil. Para muitos de nós, até não muito antes, ecologia era uma espécie de ramo da biologia, algo a ver com amebas ou protozoários. Ainda não a associávamos à conservação e proteção do meio ambiente. Só que Tom vivia em Nova York, e os americanos já tinham acordado para o problema. Um cartum na revista The New Yorker perguntava: “Lembra-se de quando o ar era limpo e o sexo era sujo?”.
Mesmo para Tom, a ecologia significava proteger a mata atlântica da fumaça, salvar os peixes nos rios, louvar os urubus, protestar contra o sumiço dos tatuís nas areias do Arpoador e denunciar os sergiodourados que, com seus espigões, impediam que da janela se visse o Corcovado. E tinha razão, porque esses eram os perigos à espreita. Tom morreu em 1994, e antes o tivéssemos escutado. Pouco depois, a coisa fugiria ao controle e novas e gravíssimas denúncias nos tirariam o sono.
Ele não pegou o aquecimento global, o derretimento das geleiras, o aumento do volume de água doce no mar, o fatal desequilíbrio que decorre disso e a inundação das cidades costeiras. Os ciclones que assolam regiões até há pouco virgens desse fenômeno. A emissão mundial de gases provocando o efeito estufa. As muitas espécies em perigo e as que já desapareceram. Etc. etc.
E, se soubesse que Lula, eleito pela expectativa de que iria botar o Brasil no caminho certo, quer explorar petróleo na bacia da Foz do Amazonas e está relaxando no desmatamento zero e na demarcação de terras indígenas, Tom não esconderia sua decepção.
Ruy Castro é escritor, jornalista e biógrafo.