Torquato Neto (1949-1972)

 

E lá estava Torquato nos alvores do dia tropicáustico, tropicalmo, as mãos cheias de versos, frases claras, frases raras, armas, araras. Torquato marca uma mudança radical, um salto quantitativo, na história disso que se chama, na falta de termo melhor, poesia brasileira. Poesia que, hoje, não apenas se lê nos livros, mas se escuta nas canções, nos discos, nos rádios, na TV, na vida, enfim. Torquato tem muito que ver com isso […]. Porque, com Torquato, começa a existir essa estranha estirpe de poetas: os letristas. Patrulhas dos mandarins das Belas Letras gostariam de lhes negar até o prestigioso título de poetas. E relegar a poesia da letra de música ao subsolo da subliteratura.

 

Folha de S. Paulo, Folhetim, 7/11/1982

 


Três da madrugada

Torquato Neto

 

Três da madrugada
Quase nada, a cidade abandonada
E essa rua que não tem mais fim
Três da madrugada
Tudo em nada
A cidade abandonada
E essa rua que não tem mais nada de mim
Nada, noite alta madrugada
Essa cidade que me guarda
Que me mata de saudade
É sempre assim
Triste madrugada
Tudo e nada, a mão fria mão gelada toca bem de leve em mim
Saiba, me pobre coração não vale nada
Pelas três da madrugada
Toda palavra calada
Dessa rua da cidade que não tem mais fim