Uma questão antiga, do interesse dos servidores do Judiciário, voltou à tona recentemente. Trata-se da execução parcial de uma diferença de vencimentos decorrente de ação proposta pelo Sindijus-PR em 1992, na 3ª Vara da Fazenda Pública. Essa demanda assegurou ao funcionalismo um reajuste salarial de 53,06%. O processo foi bastante tumultuado, e gerou propostas de acordo individual, elaboradas pela antiga administração do Tribunal de Justiça. Para os 991 servidores que não aderiram aos termos daquele documento, os créditos acumulados entre maio de 2000 e maio de 2002 ainda aguardam pagamento. Isso somente poderá ser feito por meio de precatório requisitório (confira, no destaque, um resumo do que aconteceu).
Cobrança individual – Na fase atual, a cobrança terá que ser processada individualmente. Isso porque o processo coletivo já se esgotou. De acordo com o Tema Repetitivo nº 880, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é possível, até o dia 29 de junho de 2022, a juntada de documentos referentes ao caso (leia, no final desta matéria, sobre a modulação dos efeitos da orientação do STJ).
Convênio com escritório – Tendo em vista a complexidade do caso, e considerando que existem consultores jurídicos que têm direito à execução dos “dois anos” (de maio de 2000 a maio de 2002), a Aconjur-PR firmou um convênio com Daniel Godoy Júnior Sociedade Individual de Advocacia, escritório responsável pela causa desde o seu ajuizamento. Pelo que foi ajustado, os associados que pretenderem utilizar os serviços profissionais conveniados farão contratos de honorários individuais (veja as condições no quadro a seguir). A escolha de advogado fica a critério dos interessados, mas a associação recomenda que, devido à necessidade de preservação da unidade do processo, seja mantida a orientação jurídica que foi dada em todas as fases anteriores da demanda.
Resumo dos fatos
1. Em 1992, o governo estadual impôs uma política de reajuste de vencimentos do funcionalismo contrária a princípios constitucionais. A pretexto de estabelecer igualdade entre os quadros do Executivo e dos demais Poderes, leis salariais da iniciativa do Judiciário foram vetadas parcialmente, o que gerou prejuízos enormes aos servidores atingidos. Isso fez com que o Sindijus-PR, que representa a categoria profissional remunerada pelo Tribunal de Justiça, ingressasse com várias ações judiciais, na tentativa de recuperar o poder de compra dos salários. Uma delas tramitou na 3ª Vara da Fazenda Pública (autos nº 10878/1992, de ação declaratória cominada com indenização), e resultou na condenação do Estado do Paraná ao pagamento de uma diferença correspondente a 53,04% dos valores de tabela fixados em lei.
2. O índice de reajuste foi confirmado no juízo de origem, recebendo chancela posterior, no dia 15 de março de 2000, da 2ª Câmara Cível do Tribuna de Justiça. A partir dessa decisão, o Sindicato solicitou que fosse expedida uma carta de sentença pela 3ª Vara da Fazenda Pública (nº 20466/2000), para a incorporação imediata do percentual (53,06%) às tabelas que estavam em vigor. A administração da época recebeu a ordem de pagamento contida na carta de sentença, mas fez várias ressalvas de natureza formal, com base nas quais deixou de providenciar o reajuste. Estabeleceu-se, então, uma crise que fez com que os servidores decretassem uma greve que se estendeu do dia 3 ao dia 14 de abril de 2000.
3. O movimento se encerrou sem perspectiva de solução do impasse. Na sequência daqueles dias tumultuados, o Sindicato buscou um acordo diretamente com a Procuradoria Geral do Estado (PGE). O Tribunal de Justiça, no entanto, intercedeu e inviabilizou qualquer alternativa capaz de estabelecer um consenso coletivo. Contrariando a natureza do processo, em que o Sindicato atuou como substituto processual de toda a categoria, a Presidência da época distribuiu modelos de acordos individuais aos servidores. Quem subscrevesse os documentos concordaria em desistir de uma parte do crédito de que era titular: os 53,06% seriam reduzidos para 30,74%.
4. Como as cláusulas do acordo geraram dúvidas e incertezas, foram poucas as adesões iniciais – menos de 1/3 dos titulares dos créditos (servidores e pensionistas). Definida essa transação, o pagamento a quem concordou com ela começou a ser feito em maio de 2000, de forma parcelada (a primeira parte do reajuste foi de 15%). Passados alguns meses – e por causa da indefinição sobre a demanda judicial, uma vez que a PGE apresentou vários incidentes protelatórios –, a concordância com a proposta aumentou. Em janeiro de 2002, quando cessaram as ofertas de pagamento feitas pelo Tribunal de Justiça, foram contabilizados 991 funcionários que se recusaram a subscrever os acordos.
5. Tão logo se caracterizou a quebra de isonomia na composição das tabelas salariais (quem havia assinado os termos passou a receber salários 30,74% superiores aos dos que se recusaram a assinar), o Sindijus-PR impetrou um mandado de segurança (nº 93635-2) para estender o índice menor (30,74%) a todo o funcionalismo. Isso porque essa parte da dívida do Estado havia se tornado incontroversa. Alternativamente, buscava-se assegurar, desde logo, o pagamento dos 53,06% aos que não concordaram com a proposta elaborada pelo Tribunal de Justiça. O ajuizamento dessa ação aconteceu no dia 6 de junho de 2000.
6. O mandado de segurança teve um processamento tumultuado. Em 2001, o Órgão Especial, competente para examinar a matéria, deu início ao julgamento. Na primeira sessão que enfrentou o caso, foram três votos favoráveis ao Sindicato. Era 16 de fevereiro de 2001, mas os trabalhos foram interrompidos devido a um pedido de vista. Numa outra sessão, realizada em 2 de março de 2001, o resultado apontava o reconhecimento do direito reivindicado pelo Sindijus-PR: treze desembargadores votaram pela concessão da segurança, contra apenas duas manifestações pelo indeferimento do pedido. Nesse dia, houve um novo pedido de vista.
7. Daí em diante, aconteceram muitas confusões, até que, no dia 29 de junho de 2001, o Órgão Especial reformulou o entendimento que havia adotado no início. O resultado, que já estava definido a favor dos servidores (13×2), foi mudado, e doze desembargadores passaram a sustentar a denegação do mandado de segurança, contra sete que mantiveram a concessão. Com isso, a matéria foi remetida ao STJ, num recurso interposto pelo Sindicato.
8. Ao mesmo tempo que tentava assegurar o direito de quem se recusou a assinar o acordo, o Sindijus-PR propôs uma medida judicial para desfazer as transações. Numa primeira decisão, de 20 de março de 2002, a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça revogou a homologação dos documentos (por falta de manifestação prévia do Sindicato). Em seguida, a 3ª Vara da Fazenda Pública negou-se a homologar os acordos, que foram definitivamente anulados em 19 de setembro de 2004, em grau de recurso julgado pelo Tribunal de Justiça.
9. Antes, no dia 26 de março de 2002, o Supremo Tribunal Federal (STF) havia julgado, em última instância, a questão principal. Nessa data, o reajuste de 53,06% se tornou definitivo. Não havia mais recursos para contestar o crédito do funcionalismo. Pouco tempo depois, a Lei nº 13572, de 29 de maio de 2002, fixou novas tabelas salariais para o Poder Judiciário, já com a incidência do índice de 53,06%, que se estendeu a todo o funcionalismo.
10. Restava a cobrança das verbas retroativas, por meio de precatório requisitório. Imediatamente, duas situações despontaram: para os que assinaram os acordos, os valores correspondentes ao tempo de vigência do documento (antes da sua anulação) – maio de 2000 a maio de 2002 – não integraram a cobrança, uma vez que os 30,74% haviam sido depositados administrativamente; para os que não assinaram, a execução correspondente a esse mesmo período (de dois anos) foi suspensa, pois havia uma discussão judicial no STJ que poderia levar ao pagamento imediato do crédito de 53,06%, independentemente de precatório.
11. Ocorre, todavia, que o STJ, em decisões proferidas nos dias 13 de abril de 2004 e 6 de maio de 2004, remeteu o julgamento da polêmica dos “dois anos” à Justiça estadual, que já havia manifestado entendimento contrário ao direito dos servidores.
12. Depois de várias tentativas frustradas de negociar administrativamente o crédito que não havia sido pago, o Sindicato reabriu, em 2008, a execução dos “dois anos” em favor dos servidores que não aderiram ao acordo, e também solicitou novo precatório aos que o assinaram (diferença entre 50,06% e 30,74% entre maio de 2000 e maio de 2002, decorrente da anulação dos termos de transação pelo Tribunal de Justiça).
13. Em meio a uma sucessão de manobras protelatórias, a PGE obteve decisões judiciais que declararam prescritos os créditos reivindicados pelo Sindijus-PR. O processo do interesse dos servidores que assinaram o acordo ainda não terminou. Já para os que se recusaram a subscrever os documentos, a tese da prescrição foi mantida. A ação coletiva, portanto, está encerrada. Nesse caso, é possível, com base no Tema Repetitivo nº 880, do STJ (confira abaixo), reabrir a discussão da matéria, por meio de demandas de caráter individual. O prazo para isso se esgotará no dia 29 de junho de 2022.
Os efeitos decorrentes dos comandos contidos neste acórdão ficam modulados a partir de 30/6/2017, com fundamento no § 3º do art. 927 do CPC/2015. Resta firmado, com essa modulação, que, para as decisões transitadas em julgado até 17/3/2016 (quando ainda em vigor o CPC/1973) e que estejam dependendo, para ingressar com o pedido de cumprimento de sentença, do fornecimento pelo executado de documentos ou fichas financeiras (tenha tal providência sido deferida, ou não, pelo juiz ou esteja, ou não, completa a documentação), o prazo prescricional de 5 anos para propositura da execução ou cumprimento de sentença conta-se a partir de 30/6/2017 (acórdão que acolheu parcialmente os embargos de declaração, publicado no DJe de 22/6/2018).
Modulação dos efeitos – Tema Repetitivo nº 880, do STJ