Prejuízos aos trabalhadores: PEC da reforma da Previdência ameaça aposentadorias e pensões
Entidades de representação de trabalhadores de várias categorias estão organizando estudos e mobilizações contra a reforma da Previdência, que foi apresentada ao Congresso Nacional pelo governo de Jair Bolsonaro no dia 20 de fevereiro. Trata-se da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019. Uma dessas entidades é a Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário nos Estados (Fenajud), que publicou, em seu portal na internet, uma matéria intitulada PEC da Reforma da Previdência chega ao Congresso e penaliza classe trabalhadora.
Confira, abaixo, a íntegra da análise preliminar.
PEC da Reforma da Previdência chega ao Congresso e penaliza classe trabalhadora
O documento [PEC 2/2019] prevê mudanças bruscas nas regras para aposentadoria dos trabalhadores do setor privado e servidores públicos. O texto é mais maquiavélico do que as propostas apresentadas anteriormente por outros governos. Se aprovada, a classe trabalhadora e os mais pobres serão os únicos a serem penalizados, visto que o texto desmantela as garantias mínimas de direitos dos trabalhadores previstas na Constituição de 1988.
A Câmara é onde a medida começará a tramitar. Se aprovada, a PEC seguirá para o Senado. Não há menção no documento sobre a cobrança de grandes devedores. Os únicos que escaparam foram os militares, que, segundo o governo, terão regras específicas discutidas mais tarde.
Os servidores públicos passarão a contribuir com alíquotas maiores. Para quem recebe mais que o teto do INSS, o percentual variaria de 11,68% a 16,79% da remuneração. Ainda para os servidores públicos, o governo determina que o direito à aposentadoria só pode ser concedido se for comprovado 25 anos de contribuição, com, no mínimo, dez deles no serviço público e cinco no último cargo.
A proposta prevê ainda três possibilidades de regra de transição para quem já está no sistema previdenciário, todas com prejuízo para os trabalhadores.
TRABALHADORES RURAIS
Outros afetados são os trabalhadores rurais e os mais pobres. Bolsonaro está propondo elevar a idade de aposentadoria do benefício de prestação continuada (BPC) de 65 para 70 anos e exigir que trabalhadores rurais façam uma contribuição anual de R$ 600.
CAPITALIZAÇÃO
A reforma estabelece no artigo 201-A, a adoção do modelo de capitalização, com contas individuais, para o regime de Previdência, ou seja, uma ruptura radical com o atual modelo de participação, onde o trabalhador da ativa e as empresas financiam os beneficiários. Isso deve gerar um aumento do gasto público durante o período de transição entre os dois modelos e um futuro incerto sobre o valor das aposentadorias.
ESPECIALISTA
A supervisora técnica do escritório regional do Dieese na Bahia, Ana Georgina, detalhou a proposta de forma clara e alerta para alguns pontos. De acordo com a especialista, “a aposentadoria por tempo de contribuição deixa de existir e a idade mínima se eleva de 60 para 62 anos, para mulheres, ficando em 65 anos para homens. A nova proposta prevê aumento no tempo de contribuição de 15 para 20 anos no Regime Geral da Previdência Social – RGPS e no Regime Próprio de Previdência Social – RPPS da União, Estados e municípios, com a idade mínima aumentando de 60 para 62 anos para mulheres e mantendo os 65 anos para homens, ambos com 25 anos de contribuição e 10 anos de trabalho no serviço público e 5 anos de efetivo exercício no cargo.
Para os professores do ensino infantil, fundamental e médio, a idade mínima passa para 60 anos para homens e mulheres. Atualmente, a idade mínima para professoras é 50 anos e 55 para professores, com tempo de contribuição de 25 anos para mulheres e 30 anos para homens com 10 anos de serviço público e 5 anos de efetivo exercício no cargo. Com a PEC 6/2019, o tempo de contribuição será de 25 anos para ambos”.
Além disso, Georgina disse que “para a aposentadoria rural, a proposta é de idade mínima de 60 anos, para homens e mulheres com 20 anos de contribuição. Hoje, a idade mínima para mulheres é de 55 anos e de 60 anos para os homens, com contribuição de 15 anos”.
Uma triste novidade trazida pela PEC 6/2019 é a mudança nas alíquotas de contribuição para o RGPS. Hoje, existem 3 alíquotas de 8%, 9% e 11%. Pela nova proposta, passarão a existir 4 faixas diferentes de alíquota (7,5%, 7,5% a 8,25%, 8,25% a 9,5% e 9,5% a 11,68%), dependendo da faixa salarial. Segundo essa proposta, a mesma lógica deve ser implantada no RPPS com alíquotas por faixa de renda, diferente do que ocorre hoje onde há apenas uma alíquota por RPPS, incluindo aí os militares.
A exemplo do que ocorreu com as propostas de reforma da Previdência de Temer, as regras de transição são bastante restritas, penalizando bastante trabalhadores abaixo dos 50 anos de idade. Para trabalhadores com tempo de contribuição suficiente para a aposentadoria, serão mantidas as regras atuais.
No entanto, para aqueles que ainda não alcançaram o tempo necessário, será preciso mais tempo de contribuição para receber proventos com valor menor do que o que seria recebido com as regras atuais. Isso decorre do fato de que as regras de transição valerão apenas para a idade mínima, e não para a forma de cálculo do benefício, que será a mesma contida na PEC 6/2019. Ou seja: 20 anos de contribuição equivalerão a uma aposentadoria de 60% do valor integral que seria recebido. Para cada ano trabalhado a partir daí, somam-se 2%.
Para se atingir a aposentadoria integral, serão necessários 40 anos de contribuição. A novidade é que, caso o trabalhador contribua por mais tempo, além do 40, continuará acrescentando 2% a cada ano ao valor da aposentadoria, limitado ao teto.
São muitas as alterações propostas pela PEC 6/2019. A reforma da Previdência proposta pelo governo Bolsonaro representa uma postergação do tempo de aposentadoria, bem como a potencial redução dos proventos. Num mercado de trabalho tão heterogêneo quanto o brasileiro, e com as recentes flexibilizações trazidas pela reforma trabalhista, não é exagero dizer que muitos trabalhadores podem, simplesmente, não conseguir se aposentar.
APOSENTADORIA DAS MULHERES
As mulheres serão as mais prejudicadas se a reforma for aprovada pelo Congresso Nacional. A afirmação é da professora de Economia e Relações do Trabalho da Unicamp (Cesit), Marilane Teixeira. Pelas regras atuais, segundo a professora, uma mulher de 55 anos e com 25 anos de contribuição teria de trabalhar mais cinco anos para se aposentar por idade e conseguir receber o benefício integral. Ou seja, estaria aposentada aos 60 anos e com 30 anos de contribuição.
Já pelas regras de transição propostas por Bolsonaro, que quer implementar a idade mínima de 62 anos para as mulheres, essa mesma mulher terá de trabalhar mais sete anos (55+7 = 62) para se aposentar por idade. Ainda assim, ela só chegaria a 32 anos de contribuição (25+7 = 32), e não se aposentaria com o benefício integral, que, pelas novas regras, vai exigir, no mínimo, 40 anos de contribuição.
Dessa forma, o benefício será de apenas 60% a quem atingir 20 anos de contribuição e sobe 2% por ano de contribuição que exceder esse tempo mínimo exigido na proposta de reforma, até chegar a 100% com 40 anos de contribuição.